Não deve existir
cidadão consciente residente em Lordelo do Ouro que não continue a lamentar o
estado de ruína em que se encontra este conjunto edificado do século XVIII que
corresponde ao velho Hospício de S. Francisco de Paula, também conhecido por
Quinta dos Frades, situado na Rua de Serralves.
Enquanto a icónica
Fábrica de Lanifícios de Lordelo que se situa em frente apresenta uma melhor
imagem devido à sua reabilitação recente – mesmo que venha a servir para
propósitos diferentes dos originais – parece que este antigo edifício vai
permanecer no mesmo estado durante muitos anos, se não vier a arruinar-se mais,
já que por motivos que nos são alheios deixou de estar referenciado pelo
IGESPAR e actualmente não dispõe de qualquer protecção legal.
Fundado no ano de 1780,
a arquitectura do velho hospício apresenta-se como interessante, já que se
trata de um casamento entre as linhas barrocas e neoclassicistas que vão marcar
este período de tempo, sendo esse exemplo mais bem reconhecido na sua capela,
cuja frontaria apresenta um pórtico encimado por um frontão triangular e é
sobrepujada por um largo frontão interrompido marcado por elementos sinuosos.
De resto, é certo que tenha vindo a sofrer alterações posteriores. Aqui
estiveram instalados os frades “Mínimos”
que cuidavam de outros religiosos doentes ou que necessitavam de cuidados, mas
sendo de tal modo dependentes de esmolas para manter o hospício e a sua capela,
foram forçados a abandonar o local por alturas da Segunda Invasão Francesa, em
1809, quando os recursos económicos e a mão-de-obra disponíveis para completar
as obras do conjunto inacabado eram escassos.
Há elementos num dos edíficios contíguos do hospício que remontam a uma fase posterior de ocupação, nomeadamente durante o século XIX (gradeamentos em varas, painéis de azulejos) e caixilhos de madeira em janelas que certamente não poderiam durar tanto tempo, fazendo-nos interrogar em que circunstâncias é que o antigo hospício foi reocupado e desocupado novamente − estarão directamente relacionadas com a Fábrica de Lanifícios que ocupou parte da antiga propriedade dos frades ou com o misterioso ocupante conhecido por Gouveia, que fez do antigo hospício quinta e mesmo assim não chegou a recuperar a capela e parte da casa inacabadas? (Daí o nome «Quinta do Gouveia», pelo qual também é conhecido o conjunto de ruínas, embora um dos cidadãos locais presuma que Gouveia era o nome de um proprietário anterior à fixação dos «Mínimos»)
É incrível que ainda
hoje, passados mais de duzentos anos, se verifique em vários locais do Porto e
nos seus arredores as marcas devastadoras das Invasões Francesas –
principalmente em antigas propriedades de campo, muitas das quais recuperadas em tempos mais recentes; mas mais incrível ainda é a falta de
vontade em relação às autoridades competentes em procurar salvaguardar alguns
exemplos que resistiram a esse período de tempo e clamam por maior valorização
como marca indelével da nossa história e cultura.
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