A Fortaleza de S. João
Baptista, na Foz do Douro, é um dos monumentos defensivos mais interessantes do
nosso território, não só devido à sua localização privilegiada e à área
compreendida, com um potencial enorme, mas devido ao seu enquadramento
histórico e arquitetónico. Não sendo fácil ignorá-la, não será de admirar que a
Câmara Municipal do Porto revele todo o interesse em recuperá-la (admira é que
não manifeste o mesmo interesse em relação a outros monumentos de um valor
patrimonial igualmente considerável, mas tendo em comparação com as últimas
décadas, pelo menos evoluiu muito mais nesse sentido).
Sendo justos, na
realidade o edifício que hoje vemos resulta da conjunção de dois monumentos
distintos que serviram propósitos igualmente distintos: é simultaneamente
religioso por enquadrar um espaço conventual beneditino com igreja (que hoje
está em ruínas) e militar por englobar um conjunto de baluartes – no seu
conjunto revelam parte do melhor da arquitectura portuguesa do século XVI,
progressista a nível de introdução dos modelos classicistas da Renascença e progressista
por ser a primeira fortaleza do território que quebrava em absoluto com os
então obsoletos meios defensivos medievais para acomodar peças de artilharia.
Foi a regente Dona Catarina, mãe de D. Sebastião, quem ordenou a sua construção
(apesar dos protestos dos frades beneditinos aqui já estabelecidos desde o séc.
XIII, vindo a perder o seu convento para a sua completa transformação e
adaptação a fortaleza).
A fortaleza viria a ser
sucessivamente alterada ao longo dos séculos seguintes, com melhoramentos e a
inclusão de novas canhoeiras adaptadas a proteger a entrada do Douro, mas a
capela-mor da igreja conventual, com a sua cúpula sextavada, sempre se manteve.
No século XIX desapareceram o fosso e a ponte levadiça da fortaleza, assim como
uma boa parte dos rochedos que a rodeavam, afastando-a do contacto com a foz do
rio.
Actualmente, o seu
estado e desaproveitamento indigna-nos. Uma igreja
renascentista em ruínas,
canhões enferrujados expostos aos elementos, áreas completamente degradadas e uma manutenção básica ou muito fraca comprovam
que o Estado português não sabe estimar o seu património. Sendo um local que há
muito poderia ter servido de pousada ou espaço museológico (ainda não se sabe
exactamente do que é feito do espólio do antigo Museu Etnográfico do Porto), se
bem que não desagrada a ninguém enquanto espaço cultural aberto à literatura,
música e exposições de pintura ou escultura (só precisando de maior promoção e
estima), até como discoteca, a exemplo de outras fortalezas do género, serviria
um melhor propósito do que algo votado à ruína.
O novo protocolo
assinado entre a Câmara Municipal do Porto e o Ministério da Defesa pelo menos
esclarece-nos de que realmente é possível diferentes identidades trabalharem em
conjunto para reabilitar e cuidar de um monumento (ao contrário de muitas
antigas desculpas que atiravam responsabilidades para cima de uns ou de outros
para não se fazer absolutamente nada). Mesmo cientes de que não há dinheiro ou
recursos para tudo, esperemos mesmo assim que este exemplo seja o quanto antes
replicado em casos tão ou mais flagrantes…
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